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Vitor Marques... as causas associativas e sociais de um torriense

Vitor Marques... as causas associativas e sociais de um torriense

Vítor Marques esteve connosco a conversar sobre uma experiência de vida, mas muito em especial de temas como o Sporting de Torres, Santa Casa da Misericórdia, Carnaval, Feira de São Pedro, Miss Vindimas, Rainha das Chitas... e tanto mais...

Festa - O Vítor Marques é aquilo que se pode apelidar de um verdadeiro torriense?
Vítor Marques - É verdade, um torriense nascido e criado no “castelo”, na zona histórica da cidade. Por isso posso dizer que sou mesmo um torriense “de gema”.



Festa - Como era Torres nessa época?
V. Marques - Era tudo mais simples. Brincávamos uns com os outros ao pião, jogávamos “à bola” e a tantas outras coisas que se foram perdendo com o aparecimento das tecnologias. Não vivíamos com a abundância aparente que há agora mas vivíamos bem e felizes.

Festa - Estudou por aqui, em Torres Vedras?
V. Marques - Sim, andei na escola primária e depois numa escola particular -do professor Mineiro-, que havia no “bairro novo”, ali para os lados de onde agora é a Rua Conde Tarouca e embora a cidade fosse muito mais pequena quase que nos perdíamos nessa recém criada zona urbanizada, com prédios novos e ruas todas elas muito parecidas, na época.
Só depois é que vou para a Escola António Augusto Cabral, uma escola comercial gerida pelo Grémio do Comércio, aqui em Torres Vedras, onde estudei até que surgiu a “Escola Técnica” e onde acabei o meu curso comercial, já à noite, antes de ir para a “tropa”, primeiro aqui e depois no norte de Angola.

Festa - Quando regressa, vai logo para o Banco?
V. Marques - Foi quase de imediato. Ainda em Angola enviei inscrição para todos os bancos, porque era uma coisa que me agradava, e um mês depois de chegar já tinha sido chamado para quatro deles e entrado para o Espírito Santo, em Lisboa. Depois, como o objetivo era subir na carreira, acabo por ir para o Totta Aliança -agora Santander-, que era um balcão novo com menos funcionários aqui e as prespectivas eram mais animadoras, de tal forma que passei a procurador, sub-gerente e gerente em menos de dez anos.
Mas tudo isso me fez estar a trabalhar em diversas terras diferentes, primeiro Vendas Novas e Pegões, depois Torres Novas e por fim Caldas da Rainha, mas valeu a pena e foi muito gratificante.

Festa - É pelo meio da sua carreira profissional que se começa a ver envolvido no meio associativo?
V. Marques - Sim, comecei na SR Operário, na zona onde nasci, no castelo, logo em 1970 e fui-me mantendo nos órgãos sociais até 1981.
Foi aí que me envolvi na “Festa das Chitas”, um evento que na altura tinha uma enorme aceitação, onde levavamos artistas como o Carlos do Carmo ou o Duo Ouro Negro e onde participava com outros amigos como Zé Ramos, Valente, Krapotkine, Montez, e alguns outros. Depois acabámos por passar todos para a organização da “Festa das Vindimas” que ainda hoje tem lugar. Pelo meio, e logo a seguir ao 25 de Abril, ainda fiz parte da Comissão de Moradores do Castelo, onde fui secretário, no meu bairro de sempre.

Festa - Uns tempos depois, ou talvez até pelo meio, vê-se também envolvido nas diversas Comissões que organizavam eventos como o Carnaval, a Feira de São Pedro, o Festival das Vindimas e outros. Como é que isso acontece?
V. Marques - No fundo as pessoas que organizavam uns eventos eram as mesmas que iam estando ligadas aos outros, com os que lhe referi, mais o Vitor Rodrigues, Caseiro, Melo, Humbelino, Cruz e muitos outros, pelo que era natural que também acabasse por me ver envolvido em todas elas, com esse grupo de amigos que gostava de fazer e ver acontecer coisas, aqui, em Torres Vedras.

Festa - Nesse tempo não devia ser fácil “meter ombros” a uma organização desse tipo. No Carnaval, por exemplo, como era?
V. Marques - Claro que não era fácil. Já que fala do Carnaval e estamos na altura dele, nessa altura para se começar a organizar as coisas e ter fundo de maneio, por exemplo, íamos ao Banco da Agricultura fazer uma livrança pela qual nos responsabilizávamos e avalizávamos. Depois, felizmente, sempre se conseguiu arranjar dinheiro para pagar esses empréstimos, mas era um risco, claro. Nunca tivemos que por dinheiro do nosso bolso.

Festa - Isso tem a ver também com a boa gestão que faziam dos eventos?
V. Marques - Eram pessoas já habituadas a gerir coisas, muitos nas empresas, que sem esperar qualquer retribuição que não fosse a satisfação de ver os eventos a “brilhar”, davam o seu melhor e faziam questão de que tudo resultasse e de que “sobrasse” algum dinheiro que entregávamos, em especial, no Lar de São José, o Carnaval e no SCU Torrense, com as “Vindimas”.
Uns tempos mais tarde a Câmara começou a “assenho-rar-se” de alguns dos eventos que começaram a ter, eles próprios, uma dimensão tal que já nos ultrapassava e que exigiam uma capacidade financeira enorme que uma Comissão não conseguia acompanhar, nem com empréstimos bancários, por muito boa vontade que existisse.

Festa - Mas o Vítor Marques não se desliga completamente das causas torrienses e é por essa altura que aparece ligado à Santa Casa da Misericórdia de Torres Vedras?
V. Marques - É já próximo do final dessas comissões, em 2002, que acabo por se convidado a entrar nos Órgãos Sociais da Santa Casa e venho a assumir funções de tesoureiro, porque acharam que devido a ter experiência em gestão bancária poderia ser útil, pois é uma instituição que já gere milhões, e onde me mantive durante um período de nove anos e mais três como presidente do Conselho Fiscal, até 2014.

Festa - A Santa Casa da Misericórdia de Torres Vedras movimenta uma verba tão elevada?
V. Marques - Sim, já é uma instituição muito grande e autónoma de todas as outras. As pessoas ainda pensam que as Santas Casas são tudo a mesma coisa, mas não, cada uma é uma instituição própria e gere as suas próprias verbas e atividades. A que tem mais visibilidade é a de Lisboa, devido aos “jogos”, mas todas as outras à sua maneira são instituições com algum peso também.

Festa - Qual a principal atividade da Santa Casa da Misericórdia de Torres Vedras?
V. Marques - A Santa Casa tem inúmeras atividades, onde vou só enumerar algumas para não me esquecer de muitas outras, mas Lar para Idosos, Creches, Doenças Assistidas, Atendimento Domiciliário, Higiene de Pessoas Idosas... são algumas das atividades que fazem com que a Instituição tenha cerca de centena e meia de funcionários para dar resposta a todas elas. É uma entidade de cariz social, como sabe, em que os utentes pagam uma pequena parte e o estado assume outra das fatias de custos, que vai permitindo que imensa gente possa beneficiar deste tipo de acompanhamento e serviços à comunidade, em especial à mais carenciada.

Festa - Foi um local que lhe deixou algumas saudades?
V. Marques - Como é evidente, como todas as outras. Neste caso existe uma direção capaz, que vem levando a Santa Casa a “bom porto”, mas se algum dia voltarem a necessitar de mim, claro que é um lugar a que nunca direi que não, eles sabem que podem contar sempre com toda a disponibilidade que me seja possível oferecer, “pro bono” como acontece com todos os diretores.

Festa - Outra associação onde teve papel de alguma relevância foi o Sporting C. Torres. Como aparece ligado ao clube?
V. Marques - O Sporting de Torres era ali na base do castelo, onde fui criado e já desde criança que era um dos locais para onde ia muito, embora tenha jogado basquetebol e hóquei na Física, o Sporting de Torres sempre foi o clube da “minha zona”.
Há uns anos, em 2007, a coletividade chegou a um ponto em que parou completamente, estando sem qualquer atividade desportiva. É aí que me convidam para encabeçar uma lista à liderança do clube e onde é apresentada a possibilidade de a Câmara utilizar os nossos terrenos, onde está atualmente o nosso pavilhão, para construir umas instalações provisórias para o “mercado”, porque era um dos locais indicados para esse efeito, que nos seriam entregues logo que o novo “Mercado Municipal” estivesse concluído.
Assumi a presidência do clube, onde durante quatro anos ainda utilizámos as precárias instalações antigas, sobre as quias tinhamos uma ação de despejo por parte do proprietário, porque o clube não pagava renda há dez anos, da mesma forma que não pagava a Finanças, Associações, Federações, Polícia, etc.
Tivemos uma conversa com o Carlos Miguel, presidente da Câmara nessa altura, que se mostrou sempre extremamente disponível em ajudar-nos, o que permitiu que com a essa ajuda e o contributo de algumas empresas que se vieram implantar em Torres Vedras fosse possível pagar as dívidas existentes e recomeçar com algumas modalidades como o hóquei em patins e o futsal.

Festa - Mas o Sporting de Torres não tinha receitas próprias?
V. Marques - Por estranho que pareça não. Os atletas nunca pagaram nada para jogar ou para a formação, há três anos que não se cobrava quotas quando lá chegámos e não havia qualquer fonte de receita. A única verba que entrava no clube até aí era um subsídio camarário pontual mas que ia sendo atribuído anualmente, que recentemente já não existe.

Festa - Quando chegam às novas instalações já tinham atletas novamente em competição?
V. Marques - É verdade, com algum trabalho já eram umas dezenas nessa altura - em 2011- quando nos foi entregue o pavilhão novo. É a partir daí que se dá a evolução que nos permitiu também ter ginástica acrobática, onde atualmente estão mais de duas centenas de atletas, ténis de mesa e voleibol, num total de mais de quatro centenas de praticantes. Não temos mais modalidades porque as próprias novas instalações já estão ocupadas a 100% e propostas que nos foram feitas para se iniciar andebol, basquetebol e outras modalidades tiveram que ser deixadas para trás.
Foram muitas ajudas, muita gente boa a contribuir com verbas e com o próprio trabalho e disponibilidade, que permitiu reerguer com dignidade o SCT, cuja direção deixei em 2016, sem dívidas e em plena atividade.

Festa - Continua ligado ao clube?
V. Marques - Sim, sou atualmente o presidente do Conselho Fiscal, tendo por nossa sugestão o Francisco Cândido assumido a presidência e pelo que se percebe com sucesso.

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