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Ezequiel Santos - Um "marco" na fotografia em Torres Vedras

Ezequiel Santos - Um "marco" na fotografia em Torres Vedras

Quem conta com mais de trinta anos e já tirou uma fotografia com um profissional em Torres Vedras seguramente que conhece Ezequiel Santos, “o fotógrafo”.
Perto de meio século a fotografar um pouco de tudo o que era casamento, batizado, festa ou evento, fizeram de Ezequiel Santos porventura o mais ‘notável’ fotógrafo torriense. Quem não tenha uma fotografia, um momento especial saído da máquina do fotógrafo representa seguramente a exceção.
Fomos conversar com este verdadeiro ‘ícon’ da fotografia e escutar a interessante história de uma vida...

Festa - Como começou esta paixão da fotografia?
Ezequiel Santos - Ao contrário do que é habitual acontecer, de forma profissional comecei pela fotografia técnica, para catálogos e folhetos, numa empresa onde trabalhei, no setor da pintura, desde 1962, quando tinha quinze anos. Quando regressei do serviço militar, o patrão acabou por me convidar para esse sector, devido à enorme evolução que a Casa Damião teve nessa época, e só depois é que evolui profissionalmente para a outra fotografia, de onde me conhecem mais.
Nessa altura queria outras coisas da vida, pratiquei desporto, em especial ginástica e luta greco-romana, concluí a quarta classe ‘à noite’, mas ‘passou-me pela cabeça’ que queria enveredar por outros caminhos, fazer novas coisas na vida. Tentei ir para a Força Aérea, mas como só tinha a quarta classe acabei por não ir, mas isso motivou-me a continuar a estudar, sempre à noite, e acabei por tirar o primeiro, segundo e terceiro anos na Escola Industrial,

Festa - E a fotografia onde ficou?
Ezequiel Santos - De início foi tudo muito amador, pois entretanto sou chamado para a tropa, em 1967, e havia um amigo meu, o José António Faria da Silva, que tinha estado em Angola e me diz que se me dedicasse à fotografia na tropa, se levasse uma máquina, tinha tudo para ‘ganhar umas coroas’.
Vou para o RI7 em Leiria e o meu irmão, o Lúcio, tinha comprado uma máquina na Marinha Grande e quase não a usava. Pedi-lhe a máquina emprestada e assim foi, levei-a comigo para Leiria e comecei a tirar fotografias ‘à malta’.

Festa - Era fácil tirar fotos nessa altura?
Ezequiel Santos - Sim, não tinha grande dificuldade. Mandava-as revelar lá, em Leiria, vendia a dois escudos cada e ganhava dez tostões por fotografia, o que me dava perto de cinquenta escudos por semana para pagar a excursão, que o Carlos Penetra organizava e em que vínhamos ao fim-de-semana para Torres Vedras.

Festa - O Ezequiel esteve muito tempo em Leiria?
Ezequiel Santos - Nem por isso, pois venho para Lisboa tirar a escola de cabos e a especialidade em transmissões, no BC5, na altura em que houve as grandes cheias de novembro de 67, nunca mais me esqueço, pelas muitas pessoas que morreram nessa altura, de Cascais às lezírias do Tejo. Foi nessa altura que fui para uma escola particular - nem sei como é que a minha mãe, que vendia na Praça, me arranjou duzentos e cinquenta escudos por mês para a pagar - começar a tirar o primeiro ciclo dos liceus, e deixei de tirar fotografias nesses três meses em que estive em Lisboa.
Depois venho para Mafra, a aguardar ser integrado num Batalhão, passo cá o Natal e mandam-me apresentar em Évora, de onde me mandam para os ‘adidos’, em Belém, e sou mobilizado para o norte de Moçambique.
Recebemos algum dinheiro para ‘ir para fora’ e no dia anterior a embarcar, com estou em Lisboa, vou à Rua do Ouro, à Fotocolor, e compro uma máquina fotográfica, que me custou um conto duzentos e oitenta escudos, que me deu para já ir tirando algumas fotografias no barco que nos levou.

Festa - Na altura as fotografias tinham que ser reveladas, naquelas câmara escuras que existiam. Como revelava o Ezequiel as fotos no barco?
Ezequiel Santos - Em qualquer sítio, seja nos barcos militares ou nos outros, há sempre alguém na tripulação que vende algumas coisas e também alguém que revela fotografias. Tirava algumas, mandava revelá-las e vendi-as aos colegas, no barco.
Chegamos a Lourenço Marques (Maputo) e seguimos para o porto de Nacala, depois para Nampula até chegar a Nova Freixo onde nos destinávamos. Nos últimos meses ainda fomos para Tete, mais a norte ainda e onde se podia “estrelar ovos ao sol”.
Pelo meio acabei por comprar o laboratório e a máquina - uma máquina profissional com a qual ainda fiz muitos casamentos cá, de início - que um sargento da nossa companhia tinha e fui sempre tirando fotografias, umas para vender, em que ganhava cinco tostões com cada uma, outras para recordação, pois tenho quase mil fotos pessoais de Moçambique, e muitos milhares que tiradas aos camaradas que lá estavam comigo, nos vinte e seis meses de comissão, mas sem nunca pensar, mesmo aí, em vir a ser fotógrafo uns tempos depois.
Neste entretanto, como tinha levado os livros da metrópole estava entusiasmado e sempre fui estudando, aproveitei uns dias de férias que tive, fui a Nampula fazer os exames do primeiro ciclo dos liceus, que consegui tirar lá, e compro aí os livros do curso geral dos liceus.
Regresso à metrópole, saio da tropa e venho visitar os meus amigos da Casa Damião. Encontro um dos patrões e pergunta-me o António Pedro Damião: “o que é que andaste por lá a fazer em Moçambique?”. Respondi que tinha andado a “fazer bonecos”, a tirar fotografias. Ele ficou todo entusiasmado e foi nessa altura que me disse que precisava de mim para a fotografia técnica, pois estava a precisar de fazer catálogos, arquivos e assim...


Festa - E o Ezequiel aceita?
Ezequiel Santos - Ainda lhe disse que não percebia nada desse tipo de fotografia, mas ele diz que não havia problema, que encontrava quem me ajudasse.
O Vítor Agostinho estava lá e o António Pedro pergunta-lhe se não conhece alguém que possa ajudar o Ezequiel. O Vítor acaba por me levar ao Franco, para me dar ‘uma achega’, compramos todo o material novo, tudo material técnico, e regressei à Casa Damião, agora para um departamento que foi criado destinado à fotografia técnica.

Festa - E a fotografia de pessoas e eventos?
Ezequiel Santos - Aos fins-de-semana ia fazendo casamentos, batizados e à noite o futebol de 5, pois nessa altura havia uma ‘fome’ enorme de fotografia e não havia fotógrafos que chegassem, aqui, na vila.
O António Pedro Damião sabe disso e chama-me para dizer que sabia que eu andava a fazer esse tipo de fotografia mas que não podia trabalhar lá e fazer esses trabalhos para mim.
Disse-lhe que não havia problema, que eu deixava de o fazer, mas tinha que aumentar-me o ordenado para o dobro daquilo que ganhava na altura.
Claro que nem fui aumentado nem se voltou a falar disso.
Continuei a trabalhar lá e a fazer as minhas fotografias. Ao fim de cerca de um ano a Casa Damião acaba com a fotografia técnica, pois nessa altura já não se justificava existir o departamento e acabo por fazer ainda algumas fotos para eles e para outras empresas daqui, da nossa região, no laboratório que tinha em casa.

Festa - Quando surge a loja frente à Câmara antiga?
Ezequiel Santos - Isso foi em 1975, quando me casei e abri então a loja, quase na mesma altura, a minha mulher passou a trabalhar comigo e no final de ‘75 também o meu irmão Lúcio.


Festa - Foi fácil, nessa altura?
Ezequiel Santos - Tivemos que fazer algumas obras, mas como já estava mais ou menos enquadrado no mundo da fotografia, já tinha os meus clientes, acabou por não ser muito difícil. Depois, como a Casa Hipólito, o FAS, e outras empresas da região, sabiam que me tinha especializado na fotografia técnica, um tipo de fotografia mais exigente, também acabei por ganhar esse tipo de clientes.

Festa - Quanto anos esteve a Foto Ezequiel aberta?
Ezequiel Santos - Ao público, desde 1975 até há dez anos atrás.

Festa - Qual o tipo de fotografia que mais prazer dá fazer?
Ezequiel Santos - Primeiro, ganhei um conceito de arte fotográfica, gosto muito de fotografia,. Percebo a que se destina determinada fotografia, fui evoluindo nesta arte e não é fácil responder de uma forma simples. Seja qual for o género eu gosto mesmo é de fotografar.

Festa - Há fotografias do Ezequiel um pouco por toda a região?
Ezequiel Santos - Pela região e não só, pois tenho fotografias que entraram em concursos regionais e nacionais. Tenho fotografias únicas do 25 de Abril e da saída dos presos políticos das prisões onde se encontravam, em especial de Peniche, que estão no espólio histórico do Estado.
A Câmara também me comprou o espólio que tinha com as vivências de Torres Vedras e não dizia respeito a pessoas ou eventos particulares, com o intuito de um dia virem a ser expostas.
São muito milhares de fotografias que acabam por ser o meu orgulho pessoal e como fotógrafo.


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