Carla Moleiro, investigadora do CIS-Iscte e uma das orientadoras de doutoramento de Eduardo, acrescenta: "Os homens gays e bissexuais podem ser afetados negativamente por stressores minoritários com impacto na sua experiência de Violência nas Relações Íntimas, como por exemplo estigma internalizado contra pessoas LGBTI+ e expectativas de discriminação. Assim, apesar de viverem algumas dinâmicas de violência semelhantes às de homens em relações de sexo diferente, podem enfrentar desafios específicos".
Neste estudo foram entrevistados homens portugueses de diferentes orientações sexuais que tinham sido alvo de Violência nas Relações Íntimas acerca dos processos e dinâmicas de procura de ajuda formal e informal. Paralelamente, o estudo também explorou o potencial Conflito com o Papel de Género dos homens que sofreram Violência nas Relações Íntimas. O Conflito com o Papel de Género ocorre quando papéis de género rígidos, sexistas ou restritivos causam restrição, desvalorização ou violação das outras pessoas ou da própria pessoa.
Os resultados mostraram que o tipo de violência mais experienciado foi a psicológica, como ser criticado e humilhado ou alvo de controlo coercivo e perseguição, seguida da violência física, que incluiu incidentes como ser esmurrado ou estrangulado. Além disso, durante as entrevistas, foi mencionada uma grande variedade de impactos psicológicos negativos resultantes das suas experiências de violência. A maioria dos participantes neste estudo não se sentia informada sobre a violência dirigida aos homens quando foi alvo de violência, e considerou que a violência contra os homens não é discutida na sociedade tanto quanto deveria. Eduardo Reis afirma: "Provavelmente por isso, quando os participantes sofreram violência, relataram que a violência dirigida aos homens é considerada menos grave do que a violência dirigida às mulheres".
De acordo com Patrícia Arriaga, a terceira autora deste estudo e orientadora de Eduardo, "Alguns participantes expressaram desconforto e verbalizaram não se identificar com o rótulo de 'vítima', uma vez que o termo parece implicar atributos de passividade e fraqueza. Eles sentiram que este termo tem uma conotação negativa que contrasta com a sua auto-perceção".
A equipa de investigação constatou também que alguns participantes não recorreram a fontes formais de ajuda, como centros de saúde ou terapeutas, ou apresentaram uma queixa criminal. "Foram apontadas várias razões para tal, incluindo falta de conhecimento sobre quem contactar e como seria o processo", explica Eduardo. Por último, ser homem (e, em alguns casos, ser LGBTI+) aumentou as expectativas de discriminação por parte das forças policiais e outros serviços de apoio, embora a experiência sobre este processo tenha variado entre os participantes.
Em conclusão, este estudo qualitativo informa sobre a complexidade das experiências de violência vividas por homens em relações de sexo diferente e do mesmo sexo, destacando o potencial contributo do conflito com o papel de género nos comportamentos de procura de ajuda. A equipa de investigação sugere que a formação e a sensibilização adequada sobre Violência nas Relações Íntimas dirigida a homens e os recursos existentes são fundamentais para aumentar a procura de ajuda em homens alvo de Violência nas Relações Íntimas. Acrescentam que desconstruir ativamente os papéis de género tradicionais também é fundamental para desbloquear o potencial e maximizar o bem-estar de todas as pessoas. A equipa conclui “O nosso estudo sugere que há uma necessidade urgente de sensibilizar a população sobre a violência que ocorre entre parceiros íntimos, especialmente contra homens, para garantir a utilização dos recursos de ajuda disponíveis e de respostas comunitárias eficazes em lidar com estes problemas graves”.
* Uma publicação APImprensa